
A cortina cinzenta e fria deste Outono recorta-se bem na penumbra da melancolia desejada.
A Agonia dos violinos instala-se no olhar para além da janela.
Visto-me. Saio.
Marco-me em vulto na pequena cidade deserta a horas de jantar.
Cai o cenário em tecido de noite e é a hora da solidão maior. Espreito o interior das casas e o conceito familiar que me é estranho. Uma terrina de sopa fumegante, a mulher e a criança e eu ausente. Alguém está no meu lugar.
Recolho-me por opção nos passos, um e depois outro, em frente, sempre em frente, mesmo que inverta o destino.
Procuro no bolso a garrafinha de líquido ardente, estalo a boca, puxo um cigarro.
Os olhos, o brilho dos meus olhos, fazedor de histórias, renovam a promiscuidade da esperança, que um dia consiga deixar de pensar em mim e me atende mais ao mundo.
É então que os vejo, inocentes, bebedouros do espanto, crentes de qualquer luz, desprezando medos ancestrais e conselhos sábios dos avós, na euforia da esquina. Mala às costas, aligeiram-se sem despedidas, em busca de...
Botas gigantes ao alto, gritos sem boca, olhar apressado no compromisso, o mundo em volta do umbigo, e a vida ao lado da vida sem vida, lágrima sem rosto onde rolar.
Vejo-os na ambiguidade da minha descrença, a pequenez da fragilidade e assumo-me superior e responsável pela preservação da espécie e da dor da desigualdade. Cada um tem um nome, cada um é um e são tão ou maiores do que eu e arremesso-os de novo para os nichos das ervas, no sonho ridículo de um cristo.
Hoje, prolonguei a vida a sete caracóis, agora que os mesmos atinem e façam a inversão de marcha, porque amanhã posso não passar aqui.
Texto: Valdemar Santos
Ilustração: Mariana Selva
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